Desabafo sobre estupro, assédio e violência contra a mulher

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Vocês realmente estão chocados com a notícia do estupro?
Eu não. Estou incomodada, mas seria exagero dizer que estou surpresa.
Não me causa estranheza, pois sou mulher. Saio todos os dias de casa sabendo que as chances disso acontecer são tão altas e banais quanto ser assaltada (ou até maior). Ser mulher é conviver com esse medo rotineiro. A gente engole isso a seco toda vez que escuta um “fiu fiu” na rua.
Com a mesma banalidade que eu procuro levar um guarda-chuva nos dias nublados, faço questão de não esquecer do meu spray de gengibre, taser e, se possível, um cachorro de grande porte para me acompanhar. Eu bem poderia estar exagerando, mas isso faz parte da minha rotina sempre que saio de casa. Não importa a roupa que eu esteja vestindo, não importa a hora que seja, TODOS os dias estou à mercê dos assédios na rua. Não conheço nenhuma mulher que não passe por essa situação constrangedora. Nunca sabemos se um simples “ô gostosa!” ou um carro passando devagar falando obscenidades irá virar estupro. A linha é muito tênue. Quanta liberdade é cerceada da mulher com uma “simples cantadinha”.
Para mim, todos os homens que não conheço são potenciais estupradores. Isso pq eu sou muito privilegiada, já que muitas mulheres não têm essa mesma sorte e até os conhecidos delas são possíveis agressores. Quantos pais, padastros, avôs, tios, namorados, maridos, amigos, chefes, colegas de trabalho, vizinhos, estupram com impunidade? No caso daquela menina que virou notícia, foram 33 homens. Mas o número não faz a menor diferença, pois o ato em si já é um absurdo quando praticado por 1 só. É grotesco, traumatizante, irreversível. Nunca passei por isso, mas tenho amigas próximas que já e vejo a cicatriz que ficou na vida delas. Se pudesse, eu passaria uma borracha e tiraria esse sofrimento de cada uma, mas não dá. O que posso fazer é tentar conscientizar ao menos os meus amigos aqui do Facebook de que esse tipo de atitude fere a alma, despedaça, acaba com alguém da pior maneira possível. O corpo físico pode até voltar ao normal algum dia, mas o psicológico não retorna à sua integridade.
Está difícil ser mulher e não é à toa que a sua timeline está cheia de desabafos indignados como esse. Nós estamos cansadas de pedir respeito e não recebermos. Sério, gente, é só isso… RESPEITO. Não é tão difícil assim.
As piadinhas machistas mediocrizam essas atitudes. O seu grupinho de amigos que troca fotos de mulheres e fala delas como se fossem pedaços de carne, idem. A sua cantadinha, o seu puxão de cabelo na balada, o fato de você não aceitar um fora, de não entender que ‘não’ é não, o seu álcool oferecido com segundas intenções, o seu beijo forçado, também tornam o estupro algo trivial. Você pode dizer que jamais iria estuprar alguém, mas se enche de orgulho ao falar que “a fulana é vadia” por ter certas atitudes, seja por causa de roupa curta, batom vermelho, ir na balada, postar fotos nas redes sociais e etc. Um cara que diz “Nossa, com essa roupa está pedindo!” Está dizendo: “Se eu ver uma mulher vestida assim ao meu lado, tenho o direito de estuprá-la.”. Não, você não tem esse direito. Muito menos o de julgar o comprimento da roupa alheia conforme bem entender. Isso é dar gás para a cultura do estupro. É dar o aval, a luz verde, para aquele cara ali do seu lado que teria coragem de ir até o fim – caso você não tenha – para consumar o ato. “Ah, mas ela mereceu!” Então você é tão bárbaro e culpado quanto os 33 estupradores daquela menina.
Os homens têm usado esse artifício da negação para se mascarar há muito tempo. “Quem, eu? Eu nunca faria isso!” Alguns são muito rápidos, serenos, espertos e profissionais. E o mais importante, se protegem. Constrangem as mulheres que os denunciam, fazem com que todos riam dela, agem como se ela fosse louca ou que simplesmente não merece ser ouvida. Não vamos mais aceitar isso.
Homens, por favor, se conscientizem! Se você não é assim, o seu amigo pode ser. Dá um toque nele e avisa que essa atitude é desprezível. Não se omita. Não lave suas mãos. Não finja que não é verdade. Não tire seu corpo fora.
Percebam que isso não é uma coisa absurda e anormal, é algo feito por homens que se você visse na rua não ia dizer: “Nossa, que monstro com cara de estuprador!” Entendam que eles não têm cara, não usam crachá e geralmente são os que mais pagam de “pessoas do bem”. Não são apenas favelados, feios, desarrumados, bandidos, loucos, doentes ou monstros (como tive que ler por aí); Podem ser até pais de família, pessoas nobres, excelentes profissionais em suas carreiras, lindos, limpinhos, frequentadores de igreja e ricos. Qualquer um mesmo.
“Como cultura, nós ainda nos recusamos coletivamente a aceitar que a maioria dos estupros são cometidos por homens normais, homens que têm amigos e famílias, homens que podem até mesmo ter feito coisas grandiosas e admiráveis em suas vidas. Nós nos recusamos a aceitar que caras legais estupram, e estupram com frequência. Parte do motivo de nós não aceitarmos isso é porque esse é um fato difícil de contemplar – é bem mais fácil continuar acreditando que somente homens malvados estupram, somente homens violentos e psicóticos escondidos em becos com bigodes de vilão e facas estupram, do que considerar que o estupro pode ser algo que homens comuns fazem. Homens que podem ser nossos amigos ou colegas ou mesmo pessoas que nós admiramos.”
Pensa aí quantas vezes você colaborou com a cultura do estupro e com o machismo. E isso não serve apenas para os homens. Quantas vezes culpabilizou a vítima? Quantas vezes duvidou de alguma denúncia de abuso? A “cultura do estupro” é uma cultura onde a violência sexual é considerada norma – ou seja, onde as pessoas não são ensinadas a não estuprar, mas sim ensinadas a não serem estupradas.
Não é que o não signifique NÃO, é que somente o SIM significa sim.
Talvez seja mais fácil para alguns entenderem dessa forma.
Não existe uma mulher entre as que estão lendo este texto que não tenha sido assediada verbalmente, ou agarrada à força, ou apertada, ou acariciada por alguém que não tinha nada que tocá-la. Ainda assim, a maioria de nós fica em silêncio; não dizemos nada. É hora de aprendermos a denunciar e nos impor. Se não fizermos isso, nunca conseguiremos acabar com essa loucura.
Vejo muitos caras irritados com nossas reclamações, pois eles ainda acham que são a figura autoritária e têm direito ao argumento final, nos enxergando como meras vítimas histéricas. Existem muitas formas traiçoeiras de subjugar, desonrar e desautorizar as mulheres, essa é apenas mais uma delas. Por isso nós precisamos lutar pela nossa autovalorização, tirar de nossas costas o treino de “mulher submissa” que nos foi incutido desde cedo. Devemos ficar atentas à mais ligeira invasão de nossos limites.
Precisamos aprender a expor as coisas, a ensinar para as meninas desde muito pequenas – na escola primária ou talvez até mesmo antes – que elas precisam DENUNCIAR quando alguém abusa delas de alguma maneira. É o medo da vergonha e da violência que nos mantém em silêncio. É o medo de acharem que somos culpadas de alguma forma por aquela situação ou que a provocamos. Se quisermos fazer desse mundo um local seguro para as mulheres de todos os lugares, devemos mudar nossas reações, mesmo quando parece ser muito difícil.
Vamos reconhecer que PODEMOS. Recusando-nos a ficar em silêncio. Vamos contar a verdade, vamos contar os segredos. Se expusermos tudo, acabaremos com esse comportamento. Se os homens não conseguirem escapar das consequências, eles irão parar de fazer isso. Nós merecemos liberdade. Eu também nunca mais permanecerei em silêncio sobre esse assunto. É o mínimo que posso fazer pelas mulheres.
O machismo morre na minha geração, pois dela ele não passará!
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P.S.: Antes que alguém fale, eu não odeio homens. Bem ao contrário, os admiro e tenho compaixão pelos fardos que precisam carregar. Mas isso não significa que aceitarei abuso!
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Se você ainda tem alguma dúvida sobre o que é a cultura do estupro, esse link pode te ajudar.
Tem preguiça de ler? Então assiste esse vídeo.
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